Carta-compromisso de actuação política (1985)
Lisboa, 30 de Novembro de 1985
Exº Sr. Professor Doutor Adriano Moreira
Porque Deus escreve direito por linhas tortas, os desígnios do "acaso" e o providencial da "necessidade" fizeram eleger V. Exª como Presidente da Comissão Política do CDS, com uma nova equipa directiva, a que tenho a honra de pertencer. Mudança de líder e, porque o estilo é o homem, uma inevitável alteração do discurso ideológico do partido, com redução da chamada sensibilidade liberal à dimensão de mera sensibilidade.
Acontece que, no partido, sempre me afirmei como alguém da direita liberal, desde a moção que subscrevi no último congresso a várias intervenções na comissão política e nos conselhos nacionais. Sempre estive próximo das linhas de força do discurso do Dr. Lucas Pires, menos pela amizade que a ele me liga, do que pela identidade de origens e de percurso políticos.
Não considerei e continuo a não considerar tal posição como incompatível com o apoio ao Senhor Professor e, muito menos, incompatível com o fazer parte da equipa que V. Exª dirige. Não foi por acaso que, no primeiro conselho nacional depois das últimas eleições, fui um dos primeiros conselheiros a propor expressamente a liderança do Senhor Professor e, simultaneamentem a proclamar a minha solidariedade activa para com as posições políticas do Dr. Lucas Pires.
Mas para que não surjam equívocos e eventuais acusações de oportunismo, sinto o dever de manifestar-lhe expressamente estas posições. É que podem mudar-se os tempos, mas as "viradeiras" não me fazem mudar de vontade e, muito menos de ideário. Ora, o silêncio pode gerar nebulosas e não queria deixar de clarificar situações, até porque não sei comprometer-me com reservas mentais.
Com efeito, apenas aderi ao CDS na sequência do V Congresso, acolhendo-me à sombra da bandeira do nacionalismo liberal. Porque, até então, nunca me seduziu o carisma de Freitas do Amaral (carisma, por carisma, sempre fui sá-carneirista), nem os preconceitos de esquerda do centrismo que afectavam os dirigentes históricos do CDS.
Sujei as mãos na luta política desde a adolescência, quando me comprometi na defesa da nação lusotropical. Monárquicos desde os bancos do liceu, amadureci a minha formação jurídica, que me desvendou os segredos do Estado de Direito e a axiologia jurídica personalista.
Cheguei então a dirigente da direita universitária de Coimbra e participei nas paixões dessa geração contraditória que circulava pela Cidadela e pela Oficina de Teatro. Uma geração que, repudiando o marcelismo e, sendo, pela esquerda, apodada de "extrema-direita", vivia a tensão entre certo romantismo nacional-revolucionário e a permanência de um tradicionalismo monárquicos, institucionalista e anti-estatista. Foram estas as raízes de direita cultural que nos marcaram, permitindo-nos observae a revolução de 1974 como inevitável consequência do império da esquerda.
O PREC foi para nós a continuação da resistência e, atirados para o exílio, a prisão, o saneamento ou a simples marginalidade, não pudemos, ou não quisemos, ser actores da encenação partidária ocorrida a partir de 1974. Muitos de nós vieram apenas a reencontrar-se com a política activa através da imaginação criadora do Dr. Lucas Pires, já depois da chamada revolução conservadora ter feito renascer a direita ocidental.
A história vivida e a história estudada fez-me anti-revolucionário e o pendor tradicionalista fez-me acentuar o anti-absolutismo. Permaneci de direita e assumi-me como liberal.
No meu caso, fui especialmente marcado pelo estudo da história das ideias políticas portuguesas e pela redescoberta do nacionalismo liberal de Garrett, Herculano, Pascoaes e Leonardo Coimbra. E não é por acaso que, conquenta anos antes do Dr. Lucas Pires, já Fernando Pessoa teorizava o nacionalismo liberal.
Não se trata evidentemente do neoliberalismo estrangeirado, citador dos Hayeks e outros autores da moda. E muito menos da cedência a qualquer costela jacobina. Considero, aliás, que a nossa direita integralista e salazarista sempre teve preconceitos em convergir com o liberalismo regenerador e o republicanismo conservador, esquecendo que grande parte dos nossos liberais apenas procurou restaurar o consensualismo pré-pombalino.
É este o meu "ser de direita liberal". Marcado pela mesma fonte axiológica que levou à democracia-cristã original, ainda corporativa e hierarquista (não é por acaso que o nosso primeiro partido democrata-cristão se chamou nacionalista); fiel à mesma matriz que gerou a democracia social do pós-guerra, institucionalista e personalista, considero que este fundo permanente de valores pode agora iluminar a sensibilidade liberal, acentuando a luta contra o estatismo, socialista, social-democrata ou simplesmente tecnocrático. É esta a principal frente de combate, depois de outrora ter acentuado o anti-individualismo e o anti-colectivismo.
Aquilo que considero como a terceira geração da democracia-cristã, a síntese entre a perspectiva liberal e a perspectiva cristã, por enquanto apenas se prenuncia, ainda sme claros contornos doutrinários. Mas o renascimento liberal e conservador do Ocidente vai impulsionar essa convergência que, nos países de tradição católica como o nosso revestirá formas diversas das sínteses alcançadas em sociedades marcadas pelo conservadorismo laicista dos partidos liberais clássicos.
Nacionalista por princípio e apenas liberal por conclusão, considero que o CDS só se enraizará na sociedade portuguesa quando se portugalizar doutrinariamente.
Senti-me no dever de expressar esta minha posição através do presente meio. Julgo que a melhor forma de poiar o Senhor Professor, para servir o partido e a nação, é não ser adrianista, no sentido de yesman. Não sou catavento doutrinário nem imobilista ordtodoxo. Acredito. E uma equipa é tanto mais unida quanto melhor potenciar a integração de difernetes sensibilidades e geração. Julgo que, na essênciam nada do que aqui afirmo constitui uma novidade para o Senhor Professor.
Com todo o respeito e consideração
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